Enciclopédia do caso Evandro

Extras Episódio 01

Início de 1992

Osvaldo Marcineiro chega em Guaratuba. Era um leitor de búzios, chamado de Pai-de-Santo pela população. Foi uma sensação na cidade. Sua companheira, Andrea Barros, o ajudava na organização dos afazeres. Por ela vender artesanato, conseguiu um lugar na feira de artesanato da cidade. Por conta de ser uma boa localização, o casal atraiu diversas críticas dos feirantes locais, já que eles eram recém-chegados na cidade e ali não deveria ser local para leitura de búzios. A autorização para trabalharem na feira teria vindo através do vice-presidente da associação de artesãos de Guaratuba à época, Davi dos Santos Soares.

Osvaldo era comumente acompanhado de seu amigo de longa data, o pai-de-santo Vicente de Paula Ferreira.

O trabalho de Osvaldo chamou a atenção de Beatriz Abagge, a filha do prefeito de Guaratuba, que já tinha interesse em assuntos místicos. Neste círculo social, eram comuns os encontros no terreiro de uma mãe-de-santo local, a Dona Hortência – sendo frequentado por pessoas até de classes mais poderosas, tais como empresários e vereadores.

 

06/04/1992 (Segunda-feira) – EVANDRO DESAPARECE

Evandro desaparece de manhã, mas sua mãe Maria Caetano só percebe sua ausência perto da hora do almoço. Aldo pede ajuda ao delegado-geral, José Maria de Paula Correia, para que enviasse o Grupo TIGRE. À medida que a notícia se espalha pela cidade, populares e família procuram pelo menino.

 

07/04/1992 (Terça-feira) – IMPRENSA E GRUPO TIGRE CHEGAM EM GUARATUBA

Vários jornalistas chegam na cidade para cobrir o desaparecimento. De acordo com Diógenes Caetano dos Santos Filho, os jornalistas estariam sendo impedidos pelo assessor da imprensa da prefeitura, Paulo Brasil, de divulgar o caso.

No final da tarde, chegam em Guaratuba os policiais do Grupo TIGRE: Rogério Podolak Pencai, Blaqueney Murilo Iglesias, Gerson Ricardo Rocha. São recebidos por Paulo Brasil, assessor de imprensa da prefeitura.

Aldo Abagge e Celina Abagge não estava em casa para receberem os policiais do Grupo TIGRE. Diziam que estavam numa festa. Por conta disso, se dirigem à casa da família Caetano. Depois, retornaram à casa dos Abagge por volta de 21 horas. Lá encontraram Aldo Abagge, Celina Abagge, padre Adriano Franzoi e Beatriz Abagge.

Às 23 horas, Diógenes Caetano dos Santos Filho chega na casa da família Abagge e tem uma discussão com o prefeito sobre o motivo da prefeitura estar impedindo a divulgação do desaparecimento. Aldo teria dito que isso era uma recomendação da própria polícia, para evitar que, caso o menino estivesse em cativeiro, que isso não atrapalhasse as investigações. Diógenes dizia que era um direito da família que o caso fosse divulgado, pois quanto mais gente ficasse sabendo, mais rápido Evandro seria encontrado. Diógenes e Aldo chegaram a trocar algumas agressões, no que Diógenes teria dito que “se depois o Evandro aparecer sem os órgãos, a culpa será de vocês”. De acordo com ele, havia o medo de venda de órgãos, um tema que era recorrente em jornais policiais da época.

Após isso, os policiais foram para o hotel e iniciaram as investigações no dia seguinte.

De acordo com o depoimento de Davina Correia Ramos Pikcius, teria sido também nesta noite que Beatriz Abagge (filha de Aldo Abagge), Vicente de Paula Ferreira (pai-de-santo), Davi dos Santos Soares (artesão), Andrea Barros (companheira de Osvaldo Marcineiro), Antonio Costa (empresário local) e sua esposa, Malgareth Costa, e Carmen Cristofolini (dona do imóvel onde residia Osvaldo Marcineiro e frequentadora do terreiro da Dona Hortência) teriam ido à casa da família Caetano para fazer rezas e, em seguida, partiram num carro em busca de Evandro madrugada adentro.

De acordo com depoimento de Diógenes em 2004, no carro estariam: Davina e seu marido Mario, Davi dos Santos Soares e Osvaldo Marcineiro. Osvaldo usaria suas habilidades mediúnicas para ajudar a encontrar a criança e, para tanto, estaria incorporado por uma entidade que pedia que fossem feitas oferendas com doces pela cidade. Seria neste trajeto que eles teriam passado próximo ao local onde dias depois o corpo de Evandro seria encontrado. Segundo Diógenes, Davina narrava que Osvaldo teria dito que tinha sentido “algo diferente” perto daquele local, mas que ela não teria tido coragem de andar muito pelo matagal, dado que estava muito escuro e que a chance de se ter alguma criança por lá naquela hora seria improvável.

É possível que Diógenes e Davina tenham se confundido aqui entre Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula, pois eles estavam sempre juntos e eram fisicamente parecidos.

 

08/04/1992 (Quarta-feira) – COMEÇAM INVESTIGAÇÕES DO GRUPO TIGRE

Os delegados Adauto Abreu e Leila Bertolini chegam em Guaratuba. Diógenes Caetano dos Santos Filho foi até eles, chamou-os ao seu escritório e mostrou-lhes panfletos nos quais ele criticava a administração do prefeito Aldo Abagge.

De acordo com Leila, naquela ocasião ele também narrou que seu pai, Diógenes Caetano, teria tido um caso com Celina Abagge anos atrás – o que motivou a separação de seus pais. Sobre Evandro, ele dava uma série de informações cujas fontes nunca eram reveladas, e que os caminhos que apontavam eram sempre de que Evandro já estaria morto – sendo que, até o momento, eles estavam procurando uma criança viva.

Por fim, ele teria dito que Celina seria responsável por Evandro não estar vivo. E que a morte dele seria motivada por venda de órgãos ou ritual satânico.

No mesmo dia, os delegados Adauto Abreu e Leila Bertolini retornaram para Guaratuba.

 

11/04/1992 (Sábado) – CORPO ENCONTRADO

Um corpo, reconhecido pelo pai de Evandro como o de seu filho, foi encontrado num matagal próximo à sua residência. Esse seria o mesmo local no qual o pai-de-santo Osvaldo Marcineiro teria sentido “algo diferente”, de acordo com os depoimentos de Diógenes e Davina.

De acordo com a delegada Leila Bertolini, do grupo TIGRE, neste momento o caso deixou de ser de um desaparecimento e tornou-se um caso de homicídio.

Neste mesmo dia, policiais, familiares e parte da imprensa comparecem ao local para verificarem o corpo encontrado.

O corpo foi encontrado por um lenhador que passava pela região e notou a presença de urubus. Estava sem o couro cabeludo, sem os olhos, sem partes dos dedos dos pés, sem as mãos, sem parte da coxa esquerda, com o ventre aberto e sem os órgãos internos. Além disso, aparentava estar em avançado estado de decomposição.

Dada a dificuldade de identificação da cadáver, alguns elementos ajudavam na identificação: o calção branco estampado e a chave da casa de Evandro que estava próxima. Em 2011, o jornal Tribuna da Massa conseguiu uma declaração de Maria, mãe de Evandro, na qual ela afirmava que o que levou Ademir (o pai de Evandro) a reconhecer o corpo teria sido uma marca que ele tinha nas costas.

Dias depois, próximo ao local onde o corpo foi encontrado, foi encontrado também o par de chinelos que Evandro teria usado. A delegada Leila Bertolini chegou a estranhar que os chinelos foram encontrados. Ela também estranhava o fato das chaves estarem tão próximas ao corpo, num local de destaque, como se tivessem sido colocadas lá estrategicamente para que o corpo fosse identificado.

 

15/04/1992 (Terça) – CELINA ABAGGE IMPEDE UMA MANIFESTAÇÃO DOS ALUNOS

Matéria da Folha de Londrina, escrita pela jornalista Monica Santanna, narra o evento de uma manifestação de alunos que pediam por mais segurança às autoridades. Essa manifestação foi impedida por Celina Abagge, gerando inclusive revolta de funcionários do município, conforme consta na matéria. Ao ser questionada por Monica Santanna sobre o motivo de ter feito isso, Celina Abagge se irritou com a jornalista e a conduziu para fora da cidade.

O impedimento da manifestação dos alunos levantou a suspeita de Diógenes Caetano. Mas ainda acordo com a própria Monica Santanna, o provável motivo para essa atitude explosiva de Celina teria sido seu medo de que o nome de Guaratuba se sujasse na imprensa.

 

 

02/07/1992 (Quinta) – PRISÕES

Três homens confessam que mataram o menino Evandro num ritual que teria sido encomendado por Celina Abagge. Os homens eram: o pai-de-santo Osvaldo Marcineiro, seu amigo (e também pai-de-santo) Vicente de Paula e o artesão Davi dos Santos Soares. Além de Celina, Beatriz Abagge também teria auxiliado no ritual.

Em uma fita cassete que foi divulgada na imprensa da época, Celina e Beatriz confessaram que sacrificaram o menino.

De acordo com os cinco, o ritual teria ocorrido na serraria Abagge, nos arredores de Guaratuba.

Além dessas cinco pessoas, mais duas foram apontadas como responsáveis pelo assassinato de Evandro: Francisco Sérgio Cristofolini (vizinho de Osvaldo Marcineiro, e filho da dona do imóvel no qual Osvaldo residia) e Airton Bardelli (funcionário da serraria Abagge).

No total, sete pessoas foram presas. O ritual teria custado 15 milhões de cruzeiros, e seu objetivo seria o de abrir os caminhos da fortuna e da política para a família Abagge.

A polícia suspeitava que o grupo (ou parte dele) poderia ser responsável pelo desaparecimento de outras crianças – entre elas, Guilherme Tiburtius.

Durante as investigações, a polícia descobriu que o prefeito Aldo Abagge possuía rádios transmissores sintonizados na frequência da polícia. Além disso, também encontraram os cadernos de Osvaldo Marcineiro, no qual constavam os nomes de seus clientes – entre eles, membros da família Abagge. Por fim, notou-se que não havia nenhum registro de atividade no dia do desaparecimento de Evandro.

Além do choque que as confissões causaram na imprensa, um outro fator acabou por tumultuar o caso: quem realizou as prisões não foi o Grupo TIGRE, responsável pelo caso.