EXTRAS EPISÓDIO 22
13 DE AGOSTO DE 1992 – AUDIÊNCIA COM EDÉSIO DA SILVA
Edésio é a testemunha que afirma ter visto Evandro ser sequestrado por Celina, Beatriz e mais dois homens na manhã, entre às 9:20 e 10:00, do dia seis de abril de 1992. Seu primeiro depoimento ocorreu no dia 13 de Agosto de 1992, mesmo dia que várias testemunhas de acusação também realizaram depoimentos. Porém, nos autos do processo só havia gravação em vídeo dele, sendo difícil afirmar se houve gravação dos outros.
No seu depoimento, ele não sabia dizer quem estava dirigindo o carro, mas afirmava que Celina e Beatriz estavam na frente enquanto um homem foi atrás com o menino.
A sala onde a audiência foi gravada era pequena e estavam presentes a juíza Anésia, a escrivã, Edésio, o promotor Antonio Cesar Cioffi de Moura e, ao seu lado, o assistente de acusação Carlos Airton Costa. Também estavam presentes os advogados de defesa dos sete réus, jornalistas e câmeras de vídeo. Edésio estava de costas para todos os advogados de defesa presentes.
QUANDO EDÉSIO APARECE NO CASO
A primeira menção a Edésio foi feita por Juarez José da Silva, o primeiro suspeito preso em relação ao caso Evandro, preso temporariamente dia 16 de abril de 1992. Juarez foi preso porque estava nos arredores da escola mas foi liberado ao não ter relação com o caso. Nesse interrogatório, Juarez mencionava Edésio, que foi arrolado na denúncia posteriormente.
[DOWNLOAD] Pedido de Prisão e Interrogatório de Juarez José da Silva
Edésio afirmava que conhecia Evandro e era amigo de Maria, mãe do menino. Nessa audiência do dia 13 de Agosto, a principal dúvida que se passava na cabeça das testemunhas de defesa devia ser: se Edésio era amigo da família de Evandro e viu o menino ser sequestrado dia seis de abril, porque ele só falou oficialmente sobre isso nesse dia, quatro meses após o desaparecimento do menino? Se ele viu o sequestro porque demorou tanto para falar sobre o ocorrido?
Edésio justifica dizendo que na hora não achou que fosse um sequestro e que demorou uns três dias para perceber a notícia do desaparecimento de Evandro e que apenas no dia 9 de abril ele se deu conta que aquele menino que ele viu entrando no carro era filho de sua amiga Maria. Após tomar conhecimento sobre o ocorrido ele ainda demorou para contar o caso para alguém e justifica essa demora dizendo que tinha medo, que a polícia estava trabalhando para desvirtuar as investigações e chega a mencionar que o prefeito tinha rádios da polícia em casa.
As afirmações não fazem muito sentido, uma vez que a população só ficou sabendo dos rádios pela televisão após as prisões, que só ocorreram três meses após o desaparecimento de Evandro. Mesmo que ele tivesse medo da aproximação da polícia com a família Abagge ele poderia ter recorrido a outra pessoas. Edésio afirma que mencionou o que viu para alguns amigos mas nada além disso porém não falou nada com a mãe de Evandro, mesmo afirmando que eles eram amigos, ainda que afastados.
Ele diz que em algum momento foi falar com as autoridades, mas após a prisão recebeu a visita de militares especiais, provavelmente do Grupo ÁGUIA, que o teriam conduzido até uma delegacia civil. Chegando lá o delegado, que seria de Curitiba, não quis nem ouvi-lo, pois achava que não tinha nada de especial no seu depoimento.
Em certo momento da audiência, Edésio diz que contou sua narrativa para um promotor, mas não sabe quando foi. Essa teria sido a primeira vez que Edésio contou pra alguma autoridade sobre o que ele viu naquele dia. Ele acha que o promotor era Samir Barouk, que era promotor de Paranaguá, cidade próxima de Guaratuba, e ficou designado ao caso Evandro por um período após as prisões, junto de outro promotor do Dr. Antonio Cesar Cioffi de Moura. Como vimos anteriormente, o Dr. Samir era promotor substituto durante as férias forenses, que ocorreu em julho após as prisões dos acusados nos dias 1, 2 e 3 de julho de 1992. Ele substituía o promotor designado da região, o Dr. Alcides Bittencourt.
TESTEMUNHAS QUE LEVARAM ÀS PRISÕES DE JULHO
No dia 7 de julho de 1992, Valdir Copetti Neves concluía seu dossiê “Operação Magia Negra”, citando diversas testemunhas que teriam auxiliado na resolução do caso. O nome de Edésio não é citado neste dossiê. A primeira vez que ele aparece como testemunha de acusação é na denúncia do Ministério Público datada do dia 21 de Julho de 1992, 20 dias após as prisões. Levando em consideração que ele não é citado no dossiê podemos supor que ele tenha sido contatado pelo promotor Samir Barouk entre os dias 7 e 21 de julho.
Edésio, até então, não existia no caso, não havendo registro de nenhum depoimento anterior ou interrogatório anterior. Ainda assim ele é uma das testemunhas mais importantes, com um relato bem incriminador, mas que só aparece após as prisões dos acusados. Junto de Irineu Wenceslau de Oliveira, ele é a testemunha mais referenciada nas argumentações finais do Ministério Público anteriores à pronúncia da juíza Anésia em 13 de Agosto de 1993. .
A promotoria cita que Edésio viu Beatriz e Celina no interior do veículo pertencente a Beatriz Abagge. Na época, Beatriz possuía um Ford Escort. Porém, em seu depoimento, Edésio diz não lembrar qual era o carro que viu. A promotoria também cita que Edésio afirmava ter visto Osvaldo Marcineiro dentro do carro naquela manhã do dia 6 de abril. Em seu depoimento Edésio afirma que havia mais gente dentro do carro porém não sabe ao certo quem era essa pessoa.
[DOWNLOAD] Depoimento Edésio da Silva (reduzido a termo)
QUANTOS “CHEROS” EXISTIAM EM GUARATUBA?
Davi dos Santos Soares dizia que seu cunhado era quem tinha o apelido de Chero/Cheiro. Davina Correia Ramos Pikcius dizia que o cunhado de Davi era um homem chamado Juarez – mas ela mais uma vez havia se enganado. De acordo com o depoimento de Davi, prestado dia 19 de maio de 1993 para o dossiê “Tortura Nunca Mais”, seu cunhado de apelido Cheiro se chamava José Luiz Tavares Pacheco.
Juarez José da Silva, o amigo de Edésio e o primeiro homem a ser preso ainda nas investigações do Grupo TIGRE, também era apelidado de “Cheiro”. De acordo com Diógenes Caetano dos Santos Filho em seu depoimento prestado em 2005, havia ainda um terceiro homem com o apelido de Cheiro em Guaratuba.
Na sua denúncia original, datada de 29 de maio de 1992, Diógenes afirmava que “um tal de Cheiro e um tal de Juarez estariam envolvidos com o caso. E por coincidência, Estir tem um filho chamado Juarez, que é soldado da polícia militar, e um genro de apelido de Cheiro. No entanto, como o Grupo Tigre parecia ter estabelecido sua base de operações na casa do prefeito, e como era Paulo Brasil quem levava os policiais aos locais e pessoas que eles precisavam, as investigações não foram bem sucedidas, causando as prisões de um outro Cheiro e um outro Juarez que após interrogados foram liberados, uma vez que não sabiam de nada.”
[DOWNLOAD] Denúncia de Diógenes de 29 de Maio de 1992
A menos que Davi estivesse mentindo sobre nunca ter sido chamado de Cheiro e também sobre o nome e sobrenome de seu cunhado, “Cheiro” e “Juarez” da denúncia de Diógenes provavelmente seriam a mesma pessoa: Juarez José da Silva, amigo de Edésio.
Davina e Diógenes diziam que o apelido de Davi era Cheiro e que ele tinha um cunhado chamado Juarez. Por outro lado, Davi dizia que Cheiro nunca foi seu apelido e que seu cunhado se chamava José Luiz Tavares Pacheco – e que este sim teria o apelido Cheiro.
No primeiro depoimento prestado por Diógenes em 13 de agosto de 1992, após as prisões dos acusados, ele afirmava que o Grupo TIGRE chegou logo após o desaparecimento de Evandro, e que todas as declarações que ele prestou em Curitiba foram passadas anteriormente para os membros do Grupo TIGRE. Porém, de acordo com Diógenes, os policiais do TIGRE não se interessaram. Algum tempo, depois ele teria ficado sabendo da prisão de Juarez, conhecido como “Cheiro”, que foi encaminhado para Curitiba onde teria sido espancado – porém, sem confessar o delito. Diógenes dizia que foi Paulo Brasil quem indicou Juarez para o delegado Adalto Abreu quando recebeu a informação do envolvimento de um tal de “Cheiro” e que, mas que Paulo Brasil teria indicado o Cheiro errado. O correto seria Edésio da Silva, que teria informações importantes para passar à polícia, e não Juarez. Ainda de acordo com Diógenes neste depoimento, quando Juarez retornou à delegacia de Guaratuba ficou aguardando recuperar de seus ferimentos e viu várias vezes Celina ir ver quem estava preso.
[DOWNLOAD] Depoimento de Diógenes na audiência de 13 de Agosto de 1992
A DEFESA TENTA DESQUALIFICAR EDÉSIO
Os advogados de defesa começaram a tentar desqualificar a testemunha de Edésio já nessa audiência de 13 de Agosto de 1992. Um caminho era mostrar que ele era amigo de Diógenes, e que teria sido ele quem levou Edésio para se apresentar ao promotor. O outro seria mostrar que ele já havia sido preso por porte de maconha. Edésio se defendia dizendo que nunca foi fichado, apenas apreendido com os cigarros. Edésio afirmava também que foi o próprio promotor, e não Diógenes, que o levou para se apresentar.
A Dr. Anésia tentava o tempo todo voltar para o foco da discussão, uma vez que não era o passado de Edésio que estava sendo julgado e isso não tinha relevância no momento, chegando no final do depoimento o promotor também tenta intervir na discussão sobre o passado de Edésio, afirmando ser anti-ético o que os advogados de defesa estavam fazendo. O promotor e os advogados de defesa chegam a bater boca, enquanto Anésia tenta ditar uma consignação para a escrivã mas começa a se irritar com a discussão dos homens até que o assistente de acusação desabafa sua indignação com a confusão causada na audiência e a fita da gravação termina.
Meses após esse depoimento, em dezembro, três pessoas teriam tentado coagir ele a mudar seu depoimento e dizer que nada do que ele falou aconteceu. essas três pessoas seriam Arildo da Silva, João Batista pessoa dos Santos Filho e João Carlos Anderson – este sobrinho de Celina Abagge.